Os frutos secos e secados são fundamentais numa alimenta- ção rica e variada, são ricos em proteínas, fibras, gorduras insaturadas e possuem elevados níveis de ácidos gordos essenciais, minerais e vitaminas, principalmente as vitaminas E, A, B1 e B2.
O valor que os consumidores dão aos frutos secos e secados não se cinge simplesmente ao valor nutricional e gastronó- mico. De facto, estão tão enraizados na cultura Portuguesa, que a sua utilização foi-se tornando também hábito em festividades e com uma carga muitas vezes mística ou supersticiosa. Como em todos os géneros alimentícios, é necessário salvaguardar a segurança do consumidor, e os frutos secos e secados, pela sua diversidade de natureza e origem, não são exceção.
Para avaliar a segurança dos alimentos e assegurar os interesses dos consumidores, a ASAE elabora um plano de controlo dos géneros alimentícios que se apresentam colocados no mercado retalhista, ou seja, colocados à venda ao consumidor final. Este plano de controlo (Plano Nacional de Colheita de Amostras (PNCA)), é um plano elaborado com base no risco, tendo em conta o risco associado aos géneros alimentícios, a taxa de incumprimento dos anos anteriores e a capacidade da ASAE na deteção do perigo.
O que são frutos secos e são frutos secados
A água é constituinte fundamental de todos os alimentos. No entanto, no que diz respeito à segurança alimentar e conservação dos mesmos, a água pode ser um problema.
De facto, no que concerne à preservação dos alimentos, os aspetos mais importantes para a preservação dos géneros alimentícios são a temperatura, atividade da água (Aw), pH, potencial de redução, conservantes e a competição de microorganismos.[1]
Para a indústria alimentar, mais importante que a quantidade de água presente num alimento, é a atividade que esta exerce. Na verdade, a atividade da água pode estar relacionada com a quantidade mas, em certa medida, é independente. A atividade da água, uma propriedade termodinâmica, é definida pelo equilíbrio da humidade relativa do ar que envolve o sistema à mesma temperatura, isto é, o rácio entre a pressão do vapor de água de um alimento e a pressão do vapor de água destilada da atmosfera em contacto com o alimento. Uma das formas se reduzir o Aw é através da adição de um soluto. Tradicionalmente, obtém-se esta redução com a adição de açúcar na formulação de doces e compotas ou na salga do bacalhau e presunto.[2]
Os frutos secos são os frutos que, na natureza, aparecem com uma baixa percentagem de água, nos quais se incluem os amendoins e os frutos de casca rija, como a noz, a amêndoa, a castanha e a avelã. Por outro lado, os frutos secados são frutos carnudos que posteriormente, por intervenção do homem, é-lhes retirada a maioria da água apresentando características organoléticas interessantes e diferentes à sua natureza. Nestes incluem-se por exemplo as tâmaras secas e as passas de uvas. Estes frutos, quer sejam secos ou secados, por possuírem um baixo Aw, conservam-se durante mais tempo que uma fruta convencional, no entanto não estão livres de contaminação química e microbiológica. Os alimentos com um reduzido Aw, são mais resistentes à contaminação da maioria dos microrganismos, no entanto alguns fungos, por necessitarem de uma menor quantidade de água, podem encontrar um substrato ideal para se multiplicarem livre de competição.[3] De facto, a indústria alimentar conjuga diferentes efeitos conservadores, sendo o (Aw) um dos mais importantes, baixando-se para níveis inferiores a 0.8 para aumentar a longevidade dos produtos.[4]
Frutos Secos e secados, panorama nacional
Olhando para a produção nacional de frutos secos, segundo os dados do INE, produz-se em Portugal cerca de 38.000 toneladas de frutos secos por ano, correspondentes apenas à produção de amêndoa, avelã, castanha e noz. Já em relação aos hábitos de consumo de frutos secos e secados, o Português consome em média 4,1Kg de frutos secos por ano e 0,9Kg de frutos secados por ano.
Quais os perigos associados aos frutos secos e frutos secados
De uma forma global, os perigos com maior representatividade no grupo dos frutos secos e frutos secados são as micotoxinas. Estas toxinas são produzidas por fungos e podese realçar dois importantes subgrupos: as aflatoxinas e ocratoxinas.
- Aflatoxinas
As toxinas mais importantes para este grupo de géneros alimentícios são as aflatoxinas, produzidas por três espécies de Aspergillus, A. lavus e A. parasiticus e A. nominus. Estas toxinas são um problema global e devem ser encaradas não só como uma toxina “per se”, mas também como um carcinogéneo. Na verdade, as aflatoxinas são ubiquitárias e a sua evicção total é difícil. A ingestão destas toxinas, em grandes quantidades num curto espaço de tempo, tem uma série de efeitos tóxicos, começando por efeitos agudos no fígado. Por outro lado, sabe-se que a ingestão de pequenas quantidades, prolongada no tempo, através de géneros alimentí- cios contaminados, tem efeitos carcinogénicos.[5]
- Ocratoxinas
As ocratoxinas são produzidas por fungos tais como: Penicillium Verrucosum, Aspergillus ochraceus e, ocasionalmente, pela espécie Aspergillus niger. A ocratoxina A é a principal micotoxina deste grupo e a única com interesse do ponto de vista da segurança alimentar. Os efeitos do Aw e da temperatura são os principais fatores a ter em conta no controlo do desenvolvimento destes fungos e da consequente formação da Ocratoxina A, o que torna evidente o controlo exigível aos operadores económicos na produção, manipulação, transporte e armazenagem dos géneros alimentícios. Do ponto de vista da segurança alimentar, a IARC, (International Agency for Research on Cancer), classificou a Ocratoxina A como um possível carcinogé- nio. Além disso, sabe-se que esta toxina tem efeitos nefrotó- xicos, hepatotóxicos, teratogénicos, imunotoxicos e ainda é responsável pela Nefropatia Endémica dos Balcãs.[3] Com o nível atual dos conhecimentos científicos e técnicos, e apesar dos melhoramentos introduzidos nas técnicas de produção e de armazenagem, não é possível impedir completamente o desenvolvimento destes bolores. Consequentemente, as micotoxinas não podem ser inteiramente eliminadas dos alimentos através de qualquer tratamento térmico e/ou outro tratamento e foram por isso fixados limites tão baixos quanto razoavelmente possíveis (Regulamento (CE) 1881/2006).
Resultados PNCA entre 2013 e 2015 – Grupo dos frutos secos e secados
No âmbito do Plano de controlo dos géneros alimentícios (PNCA), foram colhidas entre 2013 e 2015, para ensaios laboratoriais, 305 amostras neste grupo de géneros alimentí- cios, sendo que a repartição das colheitas pelos diversos grupos, em termos de número e de percentagem, encontrase esquematizada na tabela 1 e gráfico 1 seguinte.
Tabela 1 – Número de amostras colhidas por ano e por subgrupo
Gráfico 1 – Número e percentagem de amostras colhidas por subgrupo
Atendendo às suas características naturais e por isso ao risco associado, nas amostras colhidas neste grupo de géneros alimentícios foi principalmente pesquisada a presença de micotoxinas, nomeadamente de Aflatoxinas e Ocratoxina A. Contudo, em 2013 e na sequência de alertas RASFF, que destacavam a presença de perigos microbiológicos neste grupo de géneros alimentícios, foram colhidas amostras de frutos secos e secados para análises microbiológicas, nomeadamente para pesquisa de Salmonella em 25g e contagem de Listéria monocytogenes por grama. Neste contexto, nos anos de 2013 a 2015 foram efetuadas 343 determinações nas 305 amostras colhidas, de acordo com a distribuição indicada na tabela 2 e gráfico 2.
Tabela 2 – Tipo e número de determinações efetuadas por ano no grupo de frutos secos e secados
Gráfico 2 – Tipo e número de determinações efetuadas por ano no grupo de frutos secos e secados.
Como apresentado no gráfico 3, no total de 305 amostras colhidas neste grupo de géneros alimentícios, 12 amostras apresentaram-se não conformes, o que corresponde a 4% de não conformidades neste grupo.
Gráfico 3 – Percentagem de amostras não conformes entre 2013 e 2015 no Grupo dos frutos secos e secados
Em 2013 foram detetadas duas amostras de figos secados com um teor de Aflatoxinas muito superior ao teor máximo estabelecido no Regulamento CE n.º1881/2006, que fixa os teores máximos de certos contaminantes presentes nos géneros alimentícios. Foi ainda detetada a presença de Salmonella numa amostra de côco ralado. Atendendo a que se trata de um produto muitas vezes utilizado para a decoração de produtos de confeitaria, a sua adição nestes alimentos, quando quentes, poderá potenciar o desenvolvimento desta bactéria, sendo neste caso suscetível de constituir um risco para a saúde, dada a possibilidade da concentração de bactérias aumentar exponencialmente.
Em 2014 foi detetada numa amostra de passa de uva, a presença de Ocratoxina A num teor superior ao legalmente admissível (10µg/Kg) e duas mostras de figo secado com um teor de Aflatoxina superior ao estabelecido legalmente (10 µg/Kg).
Em 2015 foi detetada numa amostra de “sultana preta” a presença de Ocratoxina A com teor superior ao legalmente admissível. Foram ainda detetadas, com teor de Aflatoxina superior ao legalmente fixado, 4 amostras de frutos secos (1 amostra de castanha do maranhão e 3 amostras de pistáchio) e 1 amostra de fruto secado (figo).
Tabela 3 – Número de amostras conformes e não conformes por ano no grupo de frutos secos e secados.
Tabela 4 – Número e tipo de amostras conformes e não conformes por ano no grupo de frutos secos e secados
As colheitas destes géneros alimentícios devem incidir principalmente nos meses de Outono, porque é usualmente nesta época do ano que se verifica o escoamento dos lotes mais antigos, devido ao facto de ser a época de nova produ- ção de frutos. É por isso, nesta fase, que se verifica um aumento da probabilidade de encontrarmos alguma não conformidade relativamente à presença de micotoxinas.
Discussão e perspetivas futuras
Pela repercussão que podem ter a nível da saúde pública, os teores de micotoxinas nos frutos secos e secados, têm sido alvo de regulamentação que reflete uma preocupação crescente pelo seu impacto na alimentação humana. Em termos de perspetivas futuras, o facto de este estudo se basear nos dados obtidos no decurso dos últimos 3 anos, permite concluir da necessidade de se reforçar o controlo dos frutos secos e secados no que concerne à contaminação por micotoxinas. Desta forma a ASAE, como Autoridade de Segurança Alimentar em Portugal, tem, necessariamente, através do PNCA, de fazer um controlo cada vez mais rigoroso deste grupo de géneros alimentícios, aumentando o número de controlos neste grupo. Sabe-se que os teores de micotoxinas nos frutos secos e secados são em grande parte reflexo das práticas agrícolas, do transporte e do armazenamento a que estes são sujeitos, e, portanto, boas práticas ao longo de toda a cadeia são essenciais à manutenção dos teores de micotoxinas dentro dos limites impostos pela legislação Europeia.
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Referências
[1] L. Leistner, “Basic aspects of food preservation by hurdle technology,” Int. J. Food Microbiol., vol. 55, no. 1, pp. 181–186, 2000.
[2] M. S. Rahman, Handbook of Food Preservation, Second Edition. CRC Press, 2007.
[3] M. Miraglia and C. Brera, “Assessment of dietary intake of Ochratoxin A by the population of EU Member States, TASK 3.2.7,” ResearchGate, Jan. 2002.
[4] J. Troller, Water Activity and Food. Elsevier, 2012.
[5] Commission of the European Communities and Scientific Committee for Food, Reports of the Scientific Committee for Food. European Commission, 1996.
Maria Manuel Mendes1 , Mafalda T. Costa1 Afonso Soares dos Santos2 ,
1 Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, Divisão de Riscos Alimentares
2 Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Lusófona
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Fonte (ASAE): www.asae.pt
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