Desafiar o futuro da Segurança na Construção e não só!

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Passou mais uma Segurex e o 8° Encontro Nacional de Técnicos de Segurança. De novo renovam-se discussões, quezílias e vontades acerca das competências, associativismo e rumo a dar a esta actividade, ao seu enquadramento e aos seus profissionais.

Tenho lido e até participado em discussões pós-eventos, tem sido possível entender o sentimento de algumas correntes que se vão desenvolvendo. Tenho a minha opinião pessoal, e vou tentar deixar aqui à discussão alguns temas que considero relevantes, usando para tal a segurança na construção que conheço bem. Esta escolha tem por base o facto de ser uma actividade que encerra nela um vasto conjunto de assuntos e que podem ser, penso, um bom ponto de análise de toda a Higiene e Segurança no Trabalho num âmbito mais lato.

A segurança na construção, ou num âmbito mais formal a actividade que se enquadra na directiva estaleiros temporários ou móveis, continua a ser uma área da higiene e segurança no trabalho com absoluta tendência bipolar e em alguns casos multipolar.

A construção civil e obras públicas, embora sendo uma das áreas com mais legislação aplicável, porque a ela estão associadas um elevado número de subactividades de elevada especificidade e também de tarefas com enquadramento legal especifico, apresenta o panorama atípico de ter um regulamento geral que tem meio século de existência, que está no geral obsoleto, muitas vezes esquecido e apresenta demasiadas incoerências e omissões quando comparado com elementos legais recentes como a directiva equipamentos de trabalho, por exemplo.

Faz mais de 5 anos que um projecto de lei se encontra em discussão pública, ou melhor se encontrou em discussão pública, pois desse assunto nem se fala actualmente. A quem interessa este silêncio? A quem interessa a falta de clareza na legislação, as suas incongruências ou as suas omissões? Como é que existe uma lei de bases da prevenção que nos obriga a todos a ter em conta o estado de evolução técnica e da boa arte, e essa evolução não é tida em conta no quadro legal em vigor?

No que diz respeito especificamente à transposição da directiva estaleiros temporários ou móveis, o Decreto-Lei 273/2003, o caso é semelhante, sendo até caricato em alguns pontos específicos. Na minha modesta opinião, como ferramenta estruturante de uma actividade tao importante e relevante para a economia, mesmo a actual, está ferido de morte há perto de uma década.

Senão vejamos:

  • Regulamentação da coordenação de segurança – é para mim a situação mais grave e incompreensível deste regulamento. Como é possível que passados 12 anos da sua publicação, a regulamentação da figura chave que é o coordenador de segurança ainda não exista? E com esta inacção fica ao livre arbítrio de cada um a atribuição da competência para a função, formação académica ou profissional para ingresso na profissão, ratio de afectação a projectos, entre outros aspectos. As ordens profissionais não se entendem, os sindicatos querem ter uma palavra a dizer, que vai mudando consoante as tonalidades políticas, os técnicos de segurança vão continuando a fazer encontros nacionais em que vão prestando de certa forma vassalagem a todas estas entidades, e tudo vai continuando na mesma.
  • Coordenação de segurança em projecto – excepção feita aos grandes projectos, de grandes donos de obra, a coordenação de segurança em projecto é algo de que já se ouviu falar, que produz umas assinaturas e em alguns casos até dá direito a emissão de umas facturas ou recibos verdes, mas pouco mais. Quantas acções de inspecção incidiram sobre a fase de projecto? Quantas destas pediram evidências de acções de coordenação de segurança em projecto, como pedidos de fundamentação de opções arquitectónicas ou recomendação de alterações por forma a tornar o processo construtivo mais seguro para os trabalhadores?
  • Compilação técnica – passados todos estes anos ainda há na produção e nos donos de obra a associação imediata ao termo “telas finais”. E na maior parte das vezes a compilação técnica pouco mais é do que isso, um conjunto de desenhos, manuais técnicos de materiais (muitas vezes nem das Fichas de Dados de Segurança se trata), equipamentos ou produtos, e muito pouco de avaliação de riscos ou descrição técnica dos trabalhos a desenvolver no objecto construído ao longo do seu ciclo de vida útil. Porquê? Talvez porque o DL 273/2003 apresenta a compilação técnica como um conjunto de títulos e subtítulos pomposos, e que o legislador na sua superioridade entende que a legislação deve deixar espaço ao papel dos técnicos e especialistas. Pois…mas isto era se estes se entendessem e usassem este poder para se unirem em torno da melhoria das condições de trabalho, da saúde dos trabalhadores e de terceiros afectados.

Estes são no meu entender os pontos mais relevantes na demonstração de que algo vai mal, há muito tempo, nesta área. Continua toda a gente muito preocupada em discutir o equilíbrio de forças entre técnicos nível IV, VI, VII, VIII e continua a morrer gente no sector da construção, e os trabalhadores continuam a ser submetidos a condições inseguras nos seus postos de trabalho.

Estamos numa fase em que a indústria da construção civil, industrial e obras públicas se encontra em estagnação ou na melhor das hipóteses começa a dar alguns sinais de reanimação, será que não estamos a perder uma boa oportunidade de preparar o futuro? Não seria esta a melhor altura para os técnicos da higiene e segurança no trabalho se unirem e liderarem um processo de consolidação e adequação de toda a legislação?

Urge a tomada de acções estruturantes a vários níveis e em todas as áreas de actividade, todas! Urge tomar em mão os assuntos aqui abordados e trazê-los para a ordem do dia, da forma mais técnica possível! Sejam eles políticos, sociais, de ordens profissionais, de falta de consolidação e clareza da legislação, de formação ou de competência profissional para o desempenho de funções.

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Vítor Borges

Vítor Borges

O meu nome é Vitor Borges, sou QHSE Manager na SIMI – Soc. Int. De Montagens Industriais. A minha experiência profissional está intimamente ligada à gestão da prevenção, higiene e segurança no trabalho e certificações, principalmente nas áreas de actividade da construção civil e obras públicas e montagens industriais. Paralelamente, o meu percurso profissional tem sido acompanhado por uma actividade académica relevante na área da docência, em matérias ligadas à minha formação em eng.a química e HST. pt.linkedin.com/in/vborges72/en

Um comentário em “Desafiar o futuro da Segurança na Construção e não só!

  1. Concordo totalmente com este retrato atual do estado da segurança na indústria da construção. Contudo deixo duas dicas para melhor se poder entender o artigo:
    1. O projeto de lei que chegou a estar em discussão pública, e pretendia substituir o velhinho Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil, aprovado pelo Decreto n.º 41 821, de 11 de Agosto de 1958, e o Regulamento das Instalações Provisórias Destinadas ao Pessoal Empregado nas Obras, aprovado pelo Decreto n.º 46 427, de 10 de Julho de 1965, e foi publicado no BTE n.º 4 de 21709/2010, era tecnicamente deplorável que morreu de vergonha e nunca mais apareceu a público, tal foi a pancada que apanhou. Isto é verdade, e pode ser confirmado. É só fazer uma leitura cuidada aos restos mortais do dito, no BTE.
    2. Coordenadores de segurança em projeto não existem, simplesmente porque identificar perigos e avaliar riscos e estabelecer medidas preventivas, logo na fase de projeto, é tarefa que obriga a competências técnicas que não estão acessiveis a simples fotocopiadores de PSS tipo!…
    A quem interessa esta paralização da diretiva estaleiros? Aos construtores e aos donos de obras, pois não é que esta diretiva retira alguma manobra a estes atores?…

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