Resumo
Para a eficácia do processo de prevenção e gestão dos Riscos, em contexto de Ordenamento do Território, assume crucial relevância a identificação e a caracterização georreferenciadas dos diferentes Perigos, Elementos Expostos e Riscos. Atualmente, este processo só é exequível com recurso aos Sistemas de Informação Geográfica. A diversidade de níveis de informação territorial, o volume de informação que os caracteriza e a complexidade dos processos de análise espacial necessários só são possíveis com a utilização de recursos no domínio das Tecnologias de Informação Geográfica.
- Introdução
Nas sociedades contemporâneas, os fenómenos perigosos tendem a multiplicar-se. Estes fenómenos, cuja origem pode ser natural, humana ou mista, para além de se terem multiplicado exponencialmente nas últimas décadas, têm contribuído, simultaneamente, para o aumento do risco para os Elementos Expostos. Os conjuntos urbanos consolidados, cada vez mais amplos e, não raramente, em processo acelerado de conurbação, constituem-se como núcleos de concentração de risco (ver figura 1), nos quais a pressão incidente nos recursos territoriais atinge níveis insustentáveis, despoletando, simultaneamente, alterações no funcionamento normal dos sistemas naturais, contribuindo, por exemplo, para o aumento da frequência e intensidade de fenómenos climatéricos extremos por todo o globo.
Figura 1 – Localização do Risco (âmbito do Ordenamento e do Planeamento do Território)
Fonte: Santos (2014:p. 8)
Santos (2014a:20-21) refere que:
- O Homem, enquanto agente atuante na superfície do território, influencia a dinâmica natural do meio físico, através da ocupação e transformação do espaço físico e uso e exploração dos recursos naturais, e o meio físico, enquanto agente modelador da topografia, exerce influência sobre as atividades do ser humano, através, por exemplo, da ocorrência de processos naturais e da vulnerabilidade que deles decorre.
Santos (2014b:541), ainda a propósito do mesmo tema, realça que:
- São evidentes as vantagens da contemplação efetiva das problemáticas do Risco no OT, na medida em que este último inclui IGT que oferecem a capacidade para a minimização e/ou mitigação dos riscos e suas consequências para os Elementos Expostos, contribuindo para a diminuição da vulnerabilidade aos fenómenos perigosos.
Deste modo, um adequado Ordenamento do Território, que defina, para os Instrumentos de Planeamento Territorial, orientações estratégicas sustentáveis e territorialmente inclusivas e integradas, constitui-se como uma elemento preponderante no âmbito da prevenção e gestão do Risco para os Elementos Expostos.
De acordo com a Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC, 2009:12), no domínio da prevenção, gestão e mitigação do Risco, devem ser considerados alguns fatores na abordagem às propostas resultantes dos processos de elaboração ou revisão dos Planos Diretores Municipais (ver figura 2).
A consideração eficaz deste conjunto de riscos (figura 2) depende da utilização de Tecnologias de Informação Geográfica e, sobretudo, dos Sistemas de Informação Geográfica.
Figura 2 – Fatores a ter em consideração na elaboração e revisão de um PDM
Fonte: ANPC, (2009:p. 12)
- Sistemas de Informação Geográfica e Riscos Naturais, Mistos e Tecnológicos
A eficácia dos processos de Ordenamento e de Planeamento do Território, conforme defende Mendes (1993), apresenta-se muito dependente da disponibilidade de informação. Julião (2001:p. 82) refere que a “maior dificuldade centra-se nas questões relacionadas com a informação de apoio à decisão; na sua aquisição, na compatibilização e integração, na análise e modelação, na representação, na apresentação e visualização e na posterior interpretação.”
De acordo com Santos (2013:10), citando Cunha (2009:16), são estas as valências comtempladas pelos SIG:
- Recolha de dados: disponibiliza métodos para a introdução de dados geográficos (georreferenciados) e tabulares (atributos);
- Armazenamento: os dados geográficos podem ser armazenados no modelo vetorial e no modelo matricial;
- Consulta: os atributos dos dados geográficos podem ser consultados nas bases de dados;
- Análise: capacidade de responder a questões relacionadas com a interação das relações espaciais dos vários dados;
- Visualização: permite a identificação visual de relacionamentos espaciais de vizinhança, conexão e proximidade. É importante na análise exploratória de dados. Os resultados podem ser apresentados também como mapas, relatórios e gráficos.
Num contexto estritamente funcional, pode afirmar-se que um SIG é um “conjunto de ferramentas, para recolha, armazenamento, organização e seleção, transformação e representação da informação de natureza espacial do “mundo real”, para um determinado conjunto de circunstâncias” (Burrough, 1986, citado por Waugh, 2006:277).
“Uma das principais características de um SIG é a capacidade que oferece para manipulação de dados geográficos e alfanuméricos de forma integrada, sendo possível aceder à informação alfanumérica de um elemento geográfico a partir do seu elemento gráfico e vice-versa.” (Resende, 2005:38)
Tendo em consideração o conteúdo apresentado neste artigo, a cartografia municipal de Risco, sendo determinante na gestão preventiva de riscos, só será exequível com recurso aos SIG. Neste âmbito, a produção cartográfica compreenderá, sobretudo, as seguintes temáticas:
- Cartografia de Perigosidade para cada um dos perigos identificados no território;
- Cartografia de Elementos Expostos;
- Cartografia de Risco que resulta da interceção geométrica das duas primeiras.
Cada um dos diferentes objetos geográficos (variáveis) considerados no processo de produção da cartografia referenciada anteriormente terá, necessariamente, atributos descritivos distintos. Essa diversidade ponderará de forma assimétrica na aferição do valor do Risco para cada área de território, de acordo com o relacionamento dos conceitos da figura 3.
Figura 3 – Articulação dos principais conceitos na avaliação do Risco
Fonte: Julião (2009:2)
- Síntese conclusiva
Nas sociedades contemporâneas, dominadas por Riscos naturais, mistos e tecnológicos “a exercerem influência na segurança das populações na sustentabilidade ambiental e na dimensão económica, o reconhecimento e caracterização precisos dos Riscos e a sua abordagem no quadro do Ordenamento e Planeamento Territorial são processos prementes.” (Santos, 2013:11)
Brito et. al. (2008:103), neste contexto, refere que “são cada vez mais visíveis as fragilidades do território e da sociedade em relação aos diversos tipos de perigos naturais, tornando premente a criação de instrumentos de prevenção e de mecanismos de resposta a estes processos, de modo a enfrentar, de forma eficaz, os desastres com causas naturais ou antropogénicas e a prevenir ou reduzir os seus impactes.”
As políticas de gestão do território deverão contemplar, necessariamente, a exercício de gestão do território responsável e centrado na eliminação ou mitigação da “geometria” do Risco. Assim, a prática do Planeamento do Território traduzir-se-á na promoção da segurança e qualidade de vida das populações. A enfatização da prevenção, enquanto princípio que orienta o desempenho das entidades responsáveis pela elaboração de Instrumentos de Gestão Territorial, pressupõe, por sua vez, a utilização de informação credível e permanentemente atualizada e organizada em sistemas tecnológicos de informação de apoio à decisão.
O desenvolvimento destas políticas, assentando na necessidade de Informação Geográfica e do geoprocessamento desta, só se afigura possível com o recurso dos Sistemas de Informação Geográfica. Estes sistemas são os únicos que integram a totalidade das valências necessárias à produção da cartografia de Risco e que contemplam a diversidade de funcionalidades analíticas ajustadas à natureza das diversas fases associadas à operacionalização de um projeto em Sistemas de Informação Geográfica: Aquisição; Integração; Análise; Visualização de informação geográfica.
Ribeiro (2016: 295), a propósito do planeamento territorial, concretamente, do uso do solo florestal, realça “a inevitabilidade, atualmente, dos Sistemas de Informação Geográfica no âmbito da produção de cartografia de risco. Sem o recurso a esta tecnologia, não é possível executar a cartografia de risco cumprindo as exigências técnicas inerentes e respeitando a necessária conjugação de um conjunto muito significativo de níveis de informação (variáveis).”
Referências
- ANPC [Autoridade Nacional de Proteção Civil] (2008). Manual de Apoio à Elaboração e Operacionalização de Planos de Emergência de Proteção Civil. Cadernos Técnicos PROCIV 3. Carnaxide: Autoridade Nacional e Proteção Civil (ISBN: 978-972-98215-8-5). 48 p.
- ANPC (2009). Manual para a Elaboração, Revisão e Análise de PMOT na Vertente da Proteção Civil. Cadernos Técnicos PROCIV 6. Carnaxide: Autoridade Nacional e Proteção Civil (ISBN: 978-989-96121-1-2). 32 p.
- Brito, J., Tavares, A., Oliveira, F. P. (2008), Aplicação dos mecanismos perequativos a áreas de suscetibilidade naturais. Revista do Centro de Estudos de Direito do Ordenamento, do Urbanismo e do Ambiente (CEDOUA), ano XI.
- Burrough, Peter (1986), Principals of Geographical Information Systems for Land Resources Assessment, Oxford: Clarendon Press. Monographs on soil and resource surveys (ISBN: 978-019-85456-3-7), 12.
- Cunha, Sara (2009), O SIG ao serviço do Ordenamento do Território: Modelo de Implementação. Lisboa [s.e.], Dissertação de Mestrado, Faculdade de Letras – Universidade Nova do Porto. 81. p.
- Julião, Rui Pedro, et al. (2009), Guia metodológico para a produção de cartografia municipal de risco e para a criação de Sistemas de Informação Geográfica (SIG) de base Municipal, Lisboa: Autoridade Nacional e Proteção Civil/Direção Geral de Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano/Instituto Geográfico Português (ISBN: 978-989-96121-4-3).
- Mendes, José (1993), Sistema de Informação para Planeamento e Gestão Urbanística Municipal. Braga: [s.e.], Tese de Doutoramento, Universidade do Minho.
- Resende, S. (2005), Geoplanos Sistema Geográfico de monitorização de planos de Ordenamento do Território. Porto: [s.e.], Dissertação de Mestrado, Faculdade de Engenharia – Universidade Nova do Porto.
- Ribeiro, R. (2016), A eficiência do processo formal de defesa da floresta contra incêndios em Portugal (O nível de eficiência real do Guia Técnico para a elaboração de Planos Municipais de Defesa da Floresta Contra Incêndios), Madrid: [s.e.]. Tese de Doutoramento. Facultad de Ciencias Sociales – Universidad Europea de Madrid.
- Santos, João Rodrigues (2014), O Ordenamento do Território e a Formação Superior em Segurança e Proteção Civil (O Conhecimento Integrado dos Técnicos Superiores de Segurança e Proteção Civil e o seu Contributo para uma Gestão mais Eficaz do Risco com recurso aos Instrumentos de Gestão Territorial), Madrid: [s.e.]. Tese de Doutoramento. Facultad de Ciencias Sociales – Universidad Europea de Madrid.
- Santos, João Rodrigues (2013), O Ordenamento do Território, Sistemas de Informação Geográfica e Prevenção de Riscos. Lisboa: Petrica Editores. Revista Segurança, ano XLVIII (ISSN: 08070-8908), n.º 216.
- Santos, João Rodrigues (2015), Planeamento e Ordenamento do Território: Riscos e Proteção Civil, Saarbrücken: Novas Edições Académicas (ISBN: 978-3-8417-1314-8).
- Waugh, David (2006), Geography – An Integrated Approach. Oxford: Nelson 2000 (ISBN: 0-17-444706-X).
Elaborado em parceria com:
Ricardo Ribeiro – Associação Portuguesa de Técnicos de Segurança e Proteção Civil (ricardo.ribeirops@gmail.com)
- Prevenção de Incêndios Florestais: Planos de Ordenamento Florestal vs Planos de Defesa da Floresta - 28 Novembro, 2016
- Riscos socioeconómicos, Planeamento do Território e Sistemas de Informação Geográfica - 3 Novembro, 2016
- Ordenamento do Território, Riscos e Técnicos Superiores de Segurança e Protecção Civil - 14 Março, 2016