+COVID-19: algumas pedras no caminho na actual luta contra a COVID-19!

Estamos a atingir, gradualmente, taxas de incidência mais aceitáveis neste “caminho das pedras” e as notícias recentes apontam para uma abordagem de gestão do risco bem diferente (e bem melhor) da que se seguiu à primeira vaga. Apesar disso existem diversos obstáculos (ou “pedras no caminho”) que devem ser valorizados nas estratégias de gestão do risco pandémico.

Desde logo, a escassez de vacinas é um verdadeiro penedo. O fluxo contínuo esperado tem-se transformado num fornecimento quase “gota a gota” (em relação ao pretendido), o que vai atrasando bastante o objectivo de dificultar a circulação do vírus na comunidade. Isso não invalida que, pelo menos com a primeira dose, já tenhamos, grosseiramente, quase dez por cento de imunizados (e outros tantos imunizados naturalmente).

O segundo “grande pedregulho” são as mutações que o vírus vai sofrendo com o aparecimento de variantes em que o vírus se vai adaptando ao hospedeiro e tentando reagir de forma a desempenhar o seu papel e nós o nosso (uma espécie de “jogo do gato e do rato” entre as partículas virais e o nosso sistema imunológico).

Uma grande penha parece ser a disrupção económica e social, qual cancro que metastiza e que esfrangalha a “ordem” estabelecida, obrigando o Estado por vezes a titubear na resposta possível e a reinventar formas de accionar medidas de “damage control”. As consequências dessa adaptação “galgam”, os seus custos “escalam” e a consequente crise estará “ao virar da esquina”.

O quarto penhasco é a duração da imunidade e a possibilidade de reinfecção, cujos actuais resultados parecem ser tranquilizadores, mas que ainda, de facto, não sabemos o suficiente. Lá para o outono o conhecimento acumulado permitirá, por certo, as melhores estratégias de actuação.

Um quinto calhau rolado é o vaivém, ao sabor da corrente, dos interesses que atropelam valores na luta contra o SARS-CoV-2 e que embaraçam a já difícil tarefa de dificultar a desestruturação económica e social que todos vivemos, mas que não atinge todos por igual, acentuando as desigualdades já existentes. Tal determina pressões permanentes, por exemplo, de actividades económicas, de grupos profissionais ou de interesses instalados antes, durante e após a tomada de decisões.

Um sexto rochedo é o que decorre do desvio do sistema de saúde para acudir à COVID-19, com os consequentes efeitos em outra morbilidade e mortalidade que se manterão anos após o “controlo” da epidemia.

A última fraga reside no crescente cansaço pandémico, cada vez mais exaurido e insuportável que causa, cada vez mais, dissonância cognitiva, também cada vez mais acentuada, o que faz periclitar a nossa resiliência. Voltam, por exemplo e como há cem anos atrás, as manifestações anti-máscara e diversos outros movimentos contestatários por cá, felizmente, não muito frequentes.

E, dessa forma, vamo-nos adaptando à borrasca pandémica, na expectativa que a bonança esteja logo ali, outra vez, “ao virar da esquina”. É retemperador saber que os erros (assumidos ou não, isso pouco importa) vão sendo corrigidos e que a actual gestão do risco seja bem diferente (para melhor) da adoptada após a primeira vaga (para quem ouviu dizer há poucos meses que uma hierarquização de risco do tipo semáforo não era Saúde Pública …).

Lembram-se da tal questão da politic e da policy?… se calhar a actual melhoria das medidas de gestão do risco poderá estar associada a uma mais adequada definição desses papéis (é apenas uma opinião …). Oxalá o resultado seja igualmente “sorridente”.

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António de Sousa Uva

António de Sousa Uva

Médico do Trabalho, Imunoalergologista e Professor Catedrático de Saúde Ocupacional.

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